Presas políticas de Belarus através do prisma de arte
No Dia Internacional da Mulher, em 8 de março, ativistas belarussas de direitos humanos apelam para apoiar as mulheres que participaram ativamente da luta pela democracia em Belarus, pela qual ainda estão sujeitas à repressão. Especialmente para a Voice of Belarus, o projeto “Palitviázynki“, que publica retratos de presas políticas belarussas e histórias de suas vidas antes e depois da prisão, conta sobre as mulheres condenadas injustamente em Belarus, para que a sociedade não se esqueça das reprimidas em Belarus, em tempos da guerra na Ucrânia.
A presa política belarussa com a sentença mais longa é Volha Mayórava, condenada a 20 anos em uma colônia penal, ela tem 56 anos de idade. A presa política mais jovem é Anita Bakunóvitch, de 18 anos de idade. Não é raro que famílias inteiras acabem na prisão: uma mãe com sua filha, irmãs ou mesmo a família inteira.
Sviatlana Baranóuskaya foi presa por quatro meses junto com sua filha na centro de detenção preventiva Valadarka (chamado assim por estar localizado na Rua Valadárskaha, em Minsk). Elas se viram apenas uma vez quando foram levadas para lá, de pé no pátio de frente para o muro, uma ao lado da outro.
“Minha Anastassíya também me ajudou a carregar meu colchão, porque naquele momento minhas forças me deixaram completamente. O colchão estava muito ruim, eu chorei e disse que não chegaria à cela. Os corredores lá são verdes e tem odor de lama e mofo”, conta Sviatlana. As mulheres foram colocadas em celas adjacentes. “Posso dizer honestamente que senti um calor no peito por estar perto dela”, diz Svetlana com amor.
Para aquelas que estavam presas no Valadarka, há um termo ‘Rádio Valadarka’. É quando você grita pela janela e assim se comunica com outras celas. “Era o aniversário de minha filha. Disse-lhe palavras de amor e adoração pela janela. Parecia-me que todo mundo parou para me escutar”, conta Sviatlana Baranóuskaya.
A mãe e a filha cumpriram a “pena” em uma cela de isolamento até o julgamento, e foram condenadas a três anos de trabalho forçado em domicílio. Após o julgamento, Sviatlana deixou o país. A mulher atravessou a fronteira através de um pântano com temperaturas abaixo de zero e com água até a cintura. Sua filha Anastassíya permaneceu em Belarus. Sviatlana admite que sente um peso moral por ter deixado sua filha, seu neto e seu marido lá.
A jornalista Yauhéniya Dóuhaya, juntamente com a artista Hanna Tatur e algumas outras “mágicas”, criaram o projeto “Palitviázynki“. A própria Yauhéniya teve que fugir de Belarus para a Ucrânia por causa da perseguição após os protestos em 2020. E, depois que a guerra na Ucrânia começou, ela se mudou para a Polônia, onde está engajada em atividades de direitos humanos.
As belarussos agora se encontram numa situação em que seu sofrimento é desvalorizado, com a explicação de que os homens são mais propensos a serem fisicamente abusados pelas forças do regime. Mas as mulheres também são espancadas, e sofrem também uma forte pressão moral e, entre outras coisas, ameaças ao bem-estar de seus filhos.
A belarussa Ina Shyrókaya é mãe de cinco filhos. Em agosto de 2020, seu filho de 18 anos foi espancado pela polícia de choque por participar de um protesto pacífico, enquanto sua filha era voluntária que ajudava as pessoas presas no centro de detenção Akréstsina. Então ela começou a participar dos protestos e expressou ativamente sua posição política no trabalho — ela era a gerente de uma cafeteria em Hrodna. Na noite anterior à visita de Lukashenka a Hrodna, Ina colocou velas brancas e vermelhas [cores da bandeira tradicional de Belarus, de facto proibida pelo ditador – Trad.] na entrada da cafeteria. Depois disso, ela foi demitida. E depois, um dia ela foi detida e seus três filhos menores de idade foram deixadas em casa. Ina foi chantageada pelas forças do regime. Eles prometeram prender seus filhos mais velhos e levar os mais novo para um orfanato.
Ina Shyrókaya descreve a vida na prisão como simples e miserável:
— Aprendi a dormir fingindo não dormir, a comer coisas que nunca teria tocado antes, a pegar piolhos e percevejos sem tremer de repugnância, a não pentear meu cabelo durante uma semana de um banho até outro, a viver sem relógio porque o tempo dentro da prisão é irrelevante, a ferver água em uma caneca ou bacia sem pegar um choque elétrico, e se pegar, que não seja muito forte… Aprendi a lavar minhas partes íntimas, com um copo de água em um minuto, porque havia uma fila para o banheiro, a fazer salada num saco e fazer borscht de beterraba seca (colocar beterraba seca naquela sopa rala que eles dão na prisão em vez de borshtch [tradicional sopa de beterraba – Trad.]), a fazer patê de peixe de “sepulturas” (como chamamos o peixe cozinho com espinha, que recebemos três vezes por semana), a armazenar comida num tanque comum, separando-a por garrafas de água fria. Tive que aprender muitas outras coisas inúteis que nunca me viriam a calhar.
Aprendi a tirar as algemas enquanto estiver no camburão, a esticar as pernas no “copo” [cela dentro do camburão onde não é possível nem sentar nem ficar em pé — Trad.] para não se bater nas paredes durante o movimento, aprendi a fazer o relatório [obrigação de dizer seu nome e artigo incriminado – Trad.] e a fazer a cama corretamente, a esconder a garrafa de água na minha roupa antes de ser levada para o pátio, para poder despejá-la sobre o pó do pátio, porque minha companheira de cela presa política Volha Halubóvitch tinha asma e se sufocava”, conta Ina.
Ina passou mais de três meses em prisão preventiva, depois recebeu três anos de trabalho forçado em domicílio e conseguiu deixar Belarus. Mas nem todas as famílias conseguem fazer isso. Por exemplo, a presa política Alena Maushuk (condenada a seis anos de prisão) foi privada de seus direitos parentais. Uma ex-presa contou recentemente como a colônia abusau de Alena:
— Vocês não imaginam o que eles estão fazendo com ela. Ela foi privada de seus direitos parentais na colônia, por qualquer coisa, jogam ela na cela de punição. Eles apenas sorriem olhando nos olhos dela e fazem o que querem. É assustador! É muito assustador! É muito difícil moralmente, todos os meios são bons para eles numa tentativa de “quebrá-la”.
O projeto “Palitviázynki” está fazendo tudo para que as pessoas não se esqueçam daqueles heróis que lutaram por mudança democrática para o futuro de Belarus. Por nossa vez, contaremos mais sobre os projetos assim e sobre o que as mulheres belarussas passam em seu caminho rumo à nossa liberdade em comum.